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Economia

Mesmo com redução da Selic, juros do crédito caem em ritmo lento

Kelly Oliveira – Repórter da Agência Brasil
Publicado em 16/06/2018 - 14:37
Brasília
 Banco Central
© Arquivo/ Agência Brasil

Mesmo com a redução da taxa básica de juros do país, a Selic, para o menor nível histórico, os juros do crédito ao consumidor caem em ritmo lento. Na próxima semana, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) vai definir a Selic novamente e a expectativa do mercado financeiro é de manutenção da taxa em 6,5% ao ano.

Em maio, após um ciclo de cortes que começou em outubro de 2016, o Copom optou por manter a Selic em 6,5% ao ano. No início desse ciclo de reduções, a taxa ou de 14,25% para 14% ao ano. Entre outubro de 2016 e março deste ano, quando ocorreu o último corte, a Selic caiu 54,4%. Enquanto isso, a taxa média de juros para as famílias caiu 23,6%, ao ar de 74,33% ao ano, em outubro de 2016, para 56,79% ao ano, em abril de 2018. A taxa do cheque especial, uma das modalidades de crédito mais caras, ou de 328,52% para 320,96% ao ano.

No Relatório de Econômica Bancária, divulgado esta semana, o BC explicou que a Selic afeta os juros do crédito por meio de seu efeito no custo de captação, que é o custo que as instituições têm para conseguir dinheiro. “Entretanto, o custo de captação é uma média de diversas taxas de captação, que possuem maior ou menor ligação com a taxa Selic”, diz o BC.

Por exemplo, quando o dinheiro para os empréstimos vêm das cadernetas de poupança, o custo de captação está “bastante” ligado à taxa básica, quando a Selic está abaixo de 8,5% ao ano. Isso acontece porque a remuneração da poupança muda quando a Selic está abaixo de 8,5% ao ano. “O custo médio de captação depende também do volume de depósitos à vista, que não possuem qualquer remuneração – e, portanto, nenhuma conexão com a taxa Selic. Mas o custo de captação das instituições financeiras envolve também a remuneração de instrumentos de captação bastante ligados à taxa Selic, como CDBs [Certificados de Depósito Bancário] indexados ao CDI [Certificado de Depósito Interbancário]”, diz o BC.

Segundo a instituição, mesmo que reduções na taxa Selic sejam readas integralmente para as taxas de juros das operações de crédito, a queda nos custos do crédito será menor que dos juros básicos. Isso porque a Selic é apenas um dos ingredientes na formação do custo de crédito. “E, quanto menor for a participação da Selic no custo do crédito, como no caso de modalidades com altas taxas de inadimplência, menor será o impacto em termos percentuais”, diz o relatório.

Na composição das taxas de juros, segundo o BC, o custo da inadimplência responde pela maior parte (38,27%), depois vêm as despesas istrativas (25,55%) dos bancos, os tributos (22,13%) e o lucro (14,04%).

Concentração bancária

Para o professor de Finanças da Escola de istração de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV) Fabio Gallo, os juros poderiam estar mais baixos porque além de a Selic estar menor, a inadimplência das pessoas físicas também caiu: ou de 6,16%, em outubro de 2016, para 5,08%, em abril de 2017. “Realmente a inadimplência é alta, mas tem sido estabilizada para baixo nos últimos anos. Ainda temos perto de 60 milhões de brasileiros negativados, mas esse número não tem crescido”, disse Gallo.

Para o professor, o problema está na concentração bancária, com poucos bancos atuando no mercado. Em 2017, os quatro maiores bancos do país – Itaú-Unibanco, Bradesco, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal – concentraram 78,51% do crédito do país. “A concentração bancária explica muito isso. Os bancos podem manter o nível de ganhos como desejarem”, diz Gallo.

O diretor executivos de estudos e pesquisas da Associação Nacional dos Executivos em Finanças (Anefac), Miguel José Ribeiro de Oliveira, também atribui à concentração bancária a dificuldade em reduzir os juros mais rapidamente para o consumidor. Ele destaca que houve muitas incorporações de bancos nos últimos anos, reduzindo o número de participantes no mercado. Ele cita também outros fatores, como baixa oferta de crédito, carga tributária alta e os depósitos compulsórios (recursos que os bancos são obrigados a deixar depositados no BC). No caso dos depósitos compulsórios, ele lembra que recentemente o BC reduziu o volume que precisa ser recolhido pelos bancos.

Para o BC, maior concorrência entre os bancos não requer necessariamente menor nível de concentração bancária. “O Banco Central monitora a concentração do Sistema Financeiro Nacional e está atento aos riscos para o sistema e aos possíveis efeitos sobre o spread [diferença entre taxa de captação do dinheiro pelos bancos e a taxa cobrada dos clientes] bancário e outros preços. Entretanto, a relação entre concentração e spreads não é tão direta quanto o senso comum pode sugerir”, pondera no Relatório de Economia Bancária. De acordo com o BC, outros fatores estruturais são importantes para se explicar o custo do crédito: despesas istrativas, impostos, margem financeira (lucro) e inadimplência. De acordo com o relatório, em 2016, o Brasil estava no grupo de países com os sistemas bancários mais concentrados, o que inclui Austrália, Canadá, França, Holanda e Suécia.

Queda gradual

Mesmo que a Selic seja mantida no atual patamar nesta semana, Oliveira acredita que os juros ao consumidor vão continuar a cair, mas seguirão em ritmo lento de redução. “As taxas de juros sobem de elevador, bem rápido, e caem como se estivessem de escada, com um o de cada vez, muito lentamente”, disse Oliveira. Segundo ele, os juros do crédito devem cair porque ainda estão muito altos. “Como subiram muito antes e tem gordura para queimar, a tendência é que as taxas de juros caiam mesmo com a manutenção da Selic. Serão pequenas quedas, gradualmente, a não ser que o quadro externo ou político se agrave. Isso pode trazer insegurança”, avaliou.

Para o professor da FGV, os consumidores só devem pegar empréstimos se houver realmente necessidade. “Não é momento para ficar tomando crédito. É um momento de muito risco, um grau de incerteza muito grande”, disse.

Em nota, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) disse que as instituições financeiras seguem “comprometidas com a melhoria do ambiente de crédito no Brasil, contribuindo com estudos, propostas e ações concretas para reduzir estruturalmente o spread”. “Para isso, é preciso atacar os custos excessivos que oneram a concessão de crédito no Brasil, com ações que envolvam, também, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”, destacou.

Para a Febraban, um estudo recente indicou que a razão principal pela qual os spreads são mais altos no Brasil, em comparação a outros países, está nos custos elevados da intermediação financeira. “Os custos associados a inadimplência, tributação, depósitos compulsórios e outros elementos do sistema de regulação são bem mais altos no Brasil que em países emergentes relevantes, como Chile e Turquia, por exemplo”, diz a federação.